A avalanche de informações não verificadas transformou a opinião pública em tribunal, e a imprensa digital em promotoria sem responsabilidade. O recente rumor sobre suposto assédio moral entre Millie Bobby Brown e David Harbour, divulgado pelo Daily Mail sem confirmação ou provas, é o retrato de uma era em que o “publicar primeiro” vale mais do que “publicar certo”. Nem a Netflix, nem os atores se pronunciaram, e nenhuma investigação oficial foi concluída. Mesmo assim, a manchete correu o mundo em horas, alimentada por portais oportunistas e redes sociais que vivem de cliques — não de verdade.
A ausência de apuração rigorosa repete o mesmo erro que destruiu a carreira de Kevin Spacey. O ator foi absolvido de todas as acusações em 2023, mas sua reputação e seu sustento jamais se recuperaram. Hollywood o cancelou antes que a Justiça pudesse julgá-lo. Foi inocentado judicialmente, mas condenado pela opinião pública — um padrão cada vez mais comum em tempos de linchamento virtual.
Casos históricos como o da Escola Base, no Brasil, provam que a desinformação tem poder devastador. Mesmo após absolvições, as vidas das vítimas da imprensa sensacionalista nunca voltaram ao normal. O problema não é novo, mas ganhou proporções industriais com a internet: qualquer boato pode ser amplificado por algoritmos, enquanto a verdade se arrasta em meio à saturação informativa.
Hoje, basta uma “fonte anônima” para transformar boatos em manchetes e suspeitas em verdades sociais. A consequência é ética e civilizacional: quem consome informação sem questionar se torna cúmplice de destruição moral. O jornalismo, que deveria ser a trincheira da verificação, tornou-se muitas vezes o motor da difamação.
A liberdade de imprensa não pode ser confundida com liberdade de difamar. A responsabilidade deve ser proporcional ao alcance. Enquanto a mídia continuar premiando o escândalo em vez da checagem, o mundo seguirá julgando inocentes sem juiz, sem provas e sem perdão.
