Em setembro de 2025, o Nepal mergulhou em sua maior crise política desde a transição para uma república democrática em 2008. O que começou como um protesto pacífico contra a censura digital se transformou em uma onda de indignação nacional conhecida como “Protestos da Geração Z”, deixando pelo menos 22 mortos, centenas de feridos e o país sob toque de recolher militar.

O estopim foi a proibição, em 4 de setembro, de 26 plataformas de redes sociais, incluindo Facebook, WhatsApp, Instagram e YouTube. O governo alegou descumprimento de regras regulatórias, mas para milhões de jovens nepaleses, a medida foi vista como uma tentativa de silenciamento. Mais que entretenimento, as redes sociais funcionavam como ferramentas de emprego, organização política e laços com os dois milhões de cidadãos que vivem no exterior e sustentam 33% do PIB nacional com suas remessas.

A proibição reacendeu uma frustração antiga: a corrupção e o nepotismo. A campanha digital #NepokidsNepal expôs a ostentação dos filhos da elite política, em contraste com a pobreza da maioria. “Eles não apenas ignoraram a dor de uma criança. Eles nos mostraram que não importamos”, disse Mira Thapa, estudante de sociologia de 20 anos. Para muitos, essa foi a faísca que incendiou um barril de pólvora acumulado por décadas de exclusão.

Com um desemprego juvenil de 20,8%, inflação alta e uma economia marcada por 82% de empregos informais, milhares de jovens já vinham sendo forçados a migrar para o Golfo e a Malásia. Dentro do país, a desigualdade é gritante: a renda per capita não passa de US$ 1.400 ao ano, enquanto políticos exibem fortunas em viagens e carros de luxo.

Nos dias 8 e 9 de setembro, os protestos tomaram Katmandu. Edifícios governamentais foram incendiados, incluindo o parlamento e a Suprema Corte. A polícia respondeu com gás lacrimogêneo, balas de borracha e munição real. Organizações de direitos humanos denunciaram que estudantes em uniformes escolares foram alvos diretos. Pressionado, o primeiro-ministro K.P. Sharma Oli renunciou, deixando o país num perigoso vácuo de poder.

Com a renúncia, o Exército assumiu o controle. Toque de recolher, aeroporto fechado e ruas patrulhadas revelam a fragilidade institucional. Para além das fronteiras, Índia e China acompanham com preocupação, temendo que a instabilidade respingue na região.

Ainda assim, os líderes da Geração Z afirmam que seu movimento é pacífico e busca uma transformação de valores. Em declaração, defenderam um futuro com lideranças baseadas em “competência, integridade e qualificações” – um recado direto à elite política.

O Nepal, pequeno em território mas imenso em diversidade cultural, agora enfrenta uma encruzilhada histórica. A pergunta que paira é se o clamor de uma juventude conectada, frustrada e empoderada será sufocado pela força ou canalizado para a construção de uma democracia mais transparente e inclusiva.